O mundo não nasceu em palavras. Primeiro foi água e luz. Depois, árvore.
No dia 25 março 2024, ergueu-se o Ur-GENTE, um espaço sonhado a muitas mãos, edificado com a força da urgência e a teimosia de quem sabe que a arte é capaz de transformar. As paredes que já guardavam a pulsação, vibração de corpos em movimento, palavras encenadas, encontros que pareciam impossíveis, ganharam um novo chão.
Um armazém esquecido, paredes desgastadas pelo tempo, uma cancela oxidada e um telhado de chapa que, durante anos, foi invisível aos olhos de quem passava, tornou-se Ur-GENTE e presença, num território onde Ur-GENTEmente se inventa o futuro.
Dois dias depois da abertura oficial, a 27 março, dávamos início ao DJINTIS – 1º Festival Internacional de Artes Cénicas da Guiné-Bissau que, ao longo de 5 dias, reuniu um público de 1200 espetadores, aliando-se a outros lugares e palcos: o Centro Cultural Franco Bissau-Guineense, o Centro Cultural Português, a AMATL-Tenda Lúdica.
Companhias de 8 países cruzaram fronteiras, trazendo consigo histórias, gestos e vozes que atravessam o tempo. Um festival que iluminou a cidade e que reatou laços históricos com a cena artística africana e internacional, evocando a palavra de Amílcar Cabral: “A luta pela libertação é, antes que nada, um ato cultural.”
O Ur-GENTE não se esconde nas sombras da técnica, mas revela-se na transparência do fazer teatral. O seu espaço cénico de linóleo escuro e paredes de carvão não esconde as engrenagens da criação: o encaixe das varas, os cabos suspensos, os focos que aguardam histórias para iluminar. Aqui, a arte não se encerra, expande-se – entre criação, formação e intercâmbio, em resistência, em reexistência! Num país onde a esterilidade de espaços dedicados à prática das artes cénicas ainda perdura, ergueu-se um palco para quem nunca deixou de acreditar na força do corpo, da voz, do encontro.
O teatro é movimento, o corpo é território, a cultura é solo fértil onde se inscreve a memória e se planta o futuro. Que este seja apenas o início de um movimento sem fronteiras, de um ciclo que só a arte pode fazer girar. Que o Ur-GENTE continue a ser lugar de encontro, de pulsação, de resistência – um espaço vivo para mover gente, nutrir os sonhos e fazer vibrar o que não pode ser esquecido: a Liberdade!
Continuemos em movimento. “É Ur-GENTE o amor!” (Eugénio de Andrade)
É Ur-GENTE mover a GENTE! “É Ur-GENTE o amor!”
Por Carolina Rodrigues, coordenadora do projeto Ur-GENTE
O Ur-GENTE, Centro de Artes Cénicas Transdisciplinar de Bissau foi concretizado no âmbito do Programa PROCULTURA, financiado pela União Europeia, gerido e cofinanciado pelo Camões, IP – Instituto da Cooperação e da Língua.