Testemunhos
O que diz quem nos conheceEnquadrado no projeto Ur-GENTE, Centro de Artes Cénicas Transdisciplinar de Bissau, o DJINTIS acolheu artistas e companhias de vários países e as produções internas, cocriadas entre as entidades parceiras e o coletivo de formandos do respetivo projeto. A programação principal dividiu-se em 3 palcos – Ur-GENTE, Centro de Artes Cénicas Transdisciplinar de Bissau, Centro Cultural Franco Bissau Guineense e Centro Cultural Português. Fora dos palcos, ocupou a Ama Tenda Lúdica – AMATL, o auditório da Residencial Coimbra e as ruas de Bissau. A programação integrou espetáculos, residências artísticas, formação e conversas profissionais, potenciando a criação de redes de colaboração e a internacionalização das artes cénicas.
A VIDA tem um espírito de missão ímpar que alia a um horizonte de ação de longo prazo junto das suas populações alvo. O resultado é um conhecimento profundo dos contextos e um impacto óbvio no desenvolvimento dessas comunidades.
É com enorme satisfação e honra que redijo estas palavras por ocasião do 30º aniversário da ONG VIDA. Conheci a VIDA em finais de 2011 num encontro de ONGs e investigadores na Gulbenkian, pouco depois da minha chegada como professor universitário a Portugal. Desde esse momento, tem sido uma história bem-aventurada de colaboração entre uma ONG com um trabalho de desenvolvimento absolutamente único na Guiné Bissau e em Moçambique, e o nosso centro de investigação NOVAFRICA da Nova SBE na Universidade Nova de Lisboa.
Nestes 11 anos de colaboração tive a felicidade de testemunhar algumas características ímpares, que fazem da VIDA uma organização especial.
Em primeiro lugar, a VIDA tem um espírito de missão ímpar que alia a um horizonte de ação de longo prazo junto das suas populações alvo. O resultado é um conhecimento profundo dos contextos onde atua e um impacto óbvio no desenvolvimento dessas comunidades. A VIDA é uma organização altamente bem-sucedida naquilo que é o seu objetivo central, o desenvolvimento na Guiné Bissau e em Moçambique.
Em segundo lugar, as pessoas que compõem e gerem a VIDA são de facto pessoas especiais. São pessoas altamente dedicadas e de uma seriedade desarmante. Tive oportunidade de testemunhar por diversas ocasiões que para as pessoas da VIDA primeiro está o objetivo da organização e só depois a sobrevivência da própria organização.
Em terceiro lugar, e aí falo como académico, a VIDA tem uma fé cristalina no conhecimento científico. A VIDA percebe que a ciência é um dos melhores guias de ação em termos de políticas públicas: a evidência concreta, recolhida junto das populações alvo, estatisticamente fiável quando possível, constitui uma base sólida para decidir o que fazer e como fazer. A VIDA entende também que o impacto que pode ter no longo prazo depende da estruturação científica do enorme conhecimento que gera com a sua atividade.
Em todos os projectos, os homens e mulheres guineenses são actores do seu presente e do seu futuro e na equipa, curta mas muito dedicada e profissional da VIDA, encontram parceiros que os respeitam e envolvem. E agora, nesta aventura de um novo projecto de saúde comunitária em Bissau, com mais de mil ASC, que desafios e surpresas surgirão?
Cristina e a sua filha Clistina, a bebé de um mês que esta mulher tem ao colo, são parte de uma história de pequenas grandes conquistas que se faz num país de longas esperas e cíclicas desilusões. Conheço Cristina no alpendre do centro de Saúde de Varela Ialo, uma tabanka isolada no norte da Guiné-Bissau. Cristina deu à luz numa casa gerida por uma associação de mulheres. Mulheres felupes como ela, que passaram a ter os partos nas Casas das Mães, com acompanhamento especializado e no respeito pela tradição da sua etnia. Longe dos olhares dos homens da comunidade. Elas é que mandam. É sagrado, afirmam com convicção: Omi ka entra! Há outras duas estruturas como esta, uma em Suzana e outra em S. Domingos, construídas com a ajuda da ONG VIDA e o apoio de parceiros.
No final de setembro, quando visitamos, em reportagem para a RDP-África esta zona, os cerca de 200 kms que separam a tabanka de Varela da capital da Guiné-Bissau são muito mais do que isso. Na picada tornada mole pelas fortes chuvas, chegar aqui é um exercício de resistência dos veículos e de quem neles segue. (…) Neste cenário, qualquer evacuação médica é um quebra-cabeças, agravado ainda pela escassez de meios. Percebe-se a absoluta urgência em apostar nos cuidados primários, na proximidade com os profissionais de saúde e na prevenção.
Desde 2010, a VIDA tem operacionalizado no terreno um projecto da UNICEF de revitalização da Saúde Comunitária. Já formou mais de 700 agentes para promoção de 16 práticas familiares essenciais e acompanhamento na saúde materno-infantil. São homens e mulheres respeitados nas suas tabankas que assumem o compromisso de visitar periodicamente cinquenta agregados. É uma actividade supervisionada e monitorizada mensalmente numa reunião de coordenação onde são apresentados os relatórios, traçados planos de trabalho, revistas matérias, actualizadas as informações e pagos os incentivos. (…)
O Sistema de Mutualidades de Saúde, uma espécie de seguro através do qual as famílias pagam, todos os meses, uma quantia para garantir assistência e medicamentos quando precisam, também está a avançar. Com resistências mas com firmeza. Em todos os projectos, os homens e mulheres guineenses são actores do seu presente e do seu futuro e na equipa, curta mas muito dedicada e profissional da VIDA, encontram parceiros que os respeitam e envolvem. E agora, nesta aventura de um novo projecto de saúde comunitária em Bissau, com mais de mil ASC, que desafios e surpresas surgirão?
É em conjunto com a população alvo do seu trabalho que decidem o que é premente, o que faz falta, o que pode ser melhorado, sempre a pensar no bem da comunidade. E foi a partir daí que nasceram projectos na área da agricultura e da saúde materno infantil, o projecto das mutualidades e o dos furos de água.
Este ano, em Julho, regressei à Guiné-Bissau. Dezoito anos depois de ter feito a cobertura de um dos episódios conturbados da história daquele país: um golpe de estado liderado por Ansumane Mané. Desta vez foi para dar a conhecer o trabalho da Associação VIDA – Voluntariado Internacional para o Desenvolvimento Africano. E o que me saltou logo à vista foi a forma como esta ONG trabalha no terreno. (…)
“Não lhe dês o peixe, ensina-o a pescar” é um conhecido provérbio chinês que, creio, pode resumir o trabalho feito pela VIDA. É em conjunto com a população alvo do seu trabalho que decidem o que é premente, o que faz falta, o que pode ser melhorado, sempre a pensar no bem da comunidade. E foi a partir daí que nasceram projectos na área da agricultura e da saúde materno infantil, o projecto das mutualidades e o dos furos de água.
Numa região onde predomina a etnia felupe, com as suas tradições e crenças, não foi certamente fácil ajudar, por exemplo, a melhor produzir tomate ou arroz. Não foi fácil conseguir que os régulos de determinadas tabancas aceitassem que as mulheres grávidas deviam ter os filhos em condições de saúde mínimas, e não nas casas tradicionais criadas para o efeito. Não terá sido também simples implementar um seguro de saúde comunitário, nem fazer assentar a mensagem de que, mesmo quem não está doente tem de contribuir: um dia poderão ser eles a precisar. E se não forem eles, será um vizinho ou um conhecido. Certo é que conseguiram. A favor da VIDA está o facto de estarem na Guiné-Bissau há mais de 20 anos. “São quase da família”, como me dizia Paula Sambu, uma líder das mulheres de Suzana, quando questionada – a meio de uma aula de produção de pickles, ministrada na Missão Católica de Suzana – sobre a forma como encaram a presença, por exemplo, do Pedro, do Ambona, do Olálio, da Patrícia ou do Edson. E tive o privilégio de poder constatar, nas manhãs de trabalho em Suzana, Varela, Jufunco e até na distante Bulol que, de facto, é como se de família se tratasse. Eu sei. Costuma dizer-se que família não se escolhe. Ainda bem para quem, na região noroeste da Guiné-Bissau, olha para a Associação VIDA como se de família se tratasse.
Numa primeira fase, tínhamos uma escola muito precária. Praticamente não tínhamos escola. O VIDA construiu uma escola convencional, onde colocou material, carteiras, livros, bloco administrativo, casas de banho, tanque de água, condições básicas de habitabilidade para professores (…)
Vi que o VIDA procura o caminho para ficar perto do povo, perto dos mais desfavorecidos para ajudar a encontrar soluções. O que o VIDA tem feito até agora, eu acho que é o que mais positivo que se poderia fazer em prole destas populações.